quarta-feira, 8 de junho de 2011

5o tema da grade flexível: Ansiedade

1     caso clínico – ansiedade generalizada
Leia o caso clínico abaixo. Você concorda com o diagnóstico de Transtorno de Ansiedade Generalizada? Você atende pacientes com estas queixas?
É muito comum aparecerem pacientes com múltiplas queixas nos consultórios, muitas vezes com quadros extremamente parecidos com o desse paciente, e muitos desses pacientes não recebem o diagnóstico específico. Geralmente esses pacientes “acabam sobrecarregando os serviços de saúde ao se consultarem trazendo queixas somáticas que, na realidade, representam a exteriorização de sintomas psíquicos”. Mas o diagnóstico desse transtorno requer uma avaliação rigorosa, por exemplo, pesquisa de uso de substâncias ou medicamentos, transtornos psicóticos ou de humor, bem como de algumas doenças orgânicas (endocrinopatias, por exemplo), potenciais causas das manifestações de ansiedade. O quadro apresentado pelo paciente é muito sugestivo desse transtorno, porém, antes de se “fechar” um diagnóstico, deve-se excluir essas possíveis condições.
O Sr. Pacífico Leão, 53 anos, coordenador do setor de contabilidade da Construtora Desvios, veio se consultar com queixa de “tonteiras”. Ele tem crises frequentes de sensação de “cabeça vazia”, associada à cefaléia holocraniana leve, nucalgia, palpitações, sudorese e sensação de respiração curta. O quadro é quase diário, mas sempre piora no final do mês, período de fechamento do balanço financeiro. Neste período também fica irritado, tem crises de agressividade, percebe “o intestino mais solto”, apresenta dificuldade para se concentrar no trabalho e para dormir à noite. Para melhorar a concentração acaba tomando vários cafezinhos durante o dia, e para dormir à noite vem utilizando um comprimido de clonazepam de 2 mg. No ano passado, quando começou o clonazepam, o comprimido de 0,5 mg era suficiente; depois passou a precisar de metade do comprimido de 2 mg, e agora toma o comprimido inteiro, todas as noites.
Embora ele nunca tenha errado em seus relatórios contábeis, estes episódios de mal estar prejudicam muito a sua qualidade de vida.
O quadro é bem menos intenso durante as férias, mas o Sr. Pacífico “não consegue desligar”: ou está preocupado com o transito na estrada no dia da volta, ou com a possibilidade de encontrar uma fila muito grande no restaurante onde pretende almoçar.


1)    O quadro de ansiedade do Sr. Pacífico parece ser patológico, diferente da ansiedade que acomete a maioria das pessoas? Justifique.
Sim. É comum que as pessoas fiquem ansiosas com determinadas situações, como realização de provas, conclusão de algum trabalho no emprego, etc. Mas essa ansiedade geralmente não prejudica o desempenho do indivíduo, podendo até mesmo “motivá-lo” de certa forma. Mas esse não é o caso em questão. O paciente apresenta uma ansiedade muito mais intensa, que chega a prejudicar seu desempenho e o seu dia-a-dia, como levar a uma dificuldade de se concentrar no trabalho, dificuldade para dormir, e o quadro inclusive permanece durante as férias, tudo isso prejudicando muito sua qualidade de vida.

2)    Você acha que, além da psicoterapia, ele poderá se beneficiar do tratamento farmacológico? Justifique.
Sim. O quadro prejudica muito a qualidade de vida do paciente, e estudos demonstram que a combinação psicoterapia+tratamento farmacológico é mais eficaz que uma das abordagens isoladamente.

3)    Segundo os textos, que drogas são comprovadamente eficazes para o tratamento do Sr. Pacífico?
Paroxetina (ISRS), Escitalopram (ISRS), Venlafaxina (IRSN), Buspirona, e benzodiazepínicos (curtos prazos!). Imipramina (tricíclico) como 2ª escolha.
DÚVIDA: eu poderia utilizar beta-bloqueadores em dose baixa para alívio de palpitações e sudorese?? E a Sertralina seria uma boa opção? Porque de acordo com o artigo de 2010, ela não seria uma opção..

4)    Que fenômeno tem ocorrido com relação à eficácia do benzodiazepínico utilizado pelo paciente? Isto era esperado?
O uso prolongado dos benzodiazepínicos pode causar tolerância, levando a necessidade de doses cada vez maiores, como foi o que aconteceu nesse caso.

5)    Considere os efeitos adversos dos medicamentos recomendados pelos textos e escolha uma droga para o tratamento do paciente. Faça uma prescrição com o nome genérico, dose e modo de usar.
Uso oral:
Cloridrato de Paroxetina______________40mg______________ 30 cp/mês
Tomar 1 comp. pela manhã.

6)    Em quanto tempo ele começará a obter os benefícios do medicamento?
Geralmente, os benefícios começam a aparecer depois de algumas semanas de tratamento (cerca de 2 a 4 semanas). E, geralmente, a resposta plena é alcançada com cerca de 2 a 3 meses de tratamento.

7)    Em quanto tempo ele já perceberá os efeitos adversos do medicamento? Quais são os efeitos adversos mais prováveis?
Os efeitos adversos podem surgir logo após o primeiro comprimido, ou com poucos dias de tratamento. No caso da Paroxetina, que é um ISRS, os efeitos adversos mais comuns são ansiedade ou agitação iniciais, náuseas e/ou diarréia, cefaléia (o que se restringe às primeiras semanas de uso), disfunção sexual, tremores. A longo prazo, a Paroxetina pode ainda causar ganho de peso.

8)    O que fazer para evitar que ele abandone o tratamento neste período?
É de extrema importância estabelecer uma boa relação médico-paciente, e explicar que os efeitos adversos tendem a diminuir ou até mesmo desaparecer com a terapia prolongada; e que os efeitos terapêuticos podem demorar até cerca de 8 semanas para se manifestarem. Pode-se solicitar retorno para avaliação em cerca de um mês.

9)    Durante quanto tempo ele deverá manter o tratamento?
Geralmente o tratamento é mantido por no mínimo um ano.

10) Qual deverá ser a sua conduta de longo prazo com relação ao clonazepam?
O Clonazepam deve ser suspenso, mas essa suspensão não pode ser abrupta pelo risco de sintomas de abstinência. Deve-se fazer uma redução gradual da dose até a retirada completa do medicamento.

11) Três meses depois de utilizar regularmente sua prescrição, ele voltou com sintomas de ansiedade ainda intensos. Sugira uma 2ª opção de tratamento, citando o nome genérico, dose e modo de usar.
Uso oral:
Cloridrato de Venlafaxina __________25mg                     90 cp/mês
Tomar 1 cp. de 8/8 hs.
DÚVIDA: eu poderia tentar um outro ISRS, com o Escitalopram, em vez de trocar de classe? Ou o ideal é já trocar a classe do medicamento? Porque de acordo com o artigo de 2010, eu poderia apenas trocar para um outro medicamento da mesma classe.






2     caso clínico – Fobia ou ansiedade social
Maria da Assunção Crucificada, 48 anos, trabalha como digitadora na empresa Lexaton. Funcionária exemplar, ela foi convidada para trabalhar na recepção da diretoria, ganhando o dobro do salário. Ao receber o convite deu um grande sorriso falso para o chefe, aceitou (com medo de ser demitida se recusasse) e passou o restante da semana sem dormir.
Na última vez em que trabalhou com público ela quase morreu. Achava que os clientes estavam observando seus gestos e fazendo comentários maldosos sobre a sua maneira de agir. Evitava olhar diretamente para os clientes e, com o comportamento modificado por estes receios, acabava por agir de maneira realmente diferente, o que aumentava seu medo de ser criticada. Ela percebia a face enrubescer e sabia que os clientes percebiam que ela estava suando mais do que deveria. Passou a ter uns “brancos” em que não conseguia se lembrar de perguntas básicas, como o horário de funcionamento da empresa. E passou a temer antecipadamente os brancos. A única hora do dia em que estava tranqüila era logo após bater o ponto da saída, quando caminhava sozinha e pegava o metrô para casa. Mas todos os dias, ao acordar, ela já sentia o coração bater mais forte com receio de ser ridicularizada, em plena recepção, no meio do público e das colegas. A história não terminou bem: passou a tomar uma dose de Campari antes de ir trabalhar, outra no almoço, e em pouco tempo foi demitida.
Passou meses em casa, morando apenas com sua mãe, já idosa e bastante surda. Seu enorme desejo de se relacionar com as pessoas, só era menor que seu medo de se expor em público. Quando finalmente recebeu um telefonema oferecendo o emprego de digitadora achou que sua vida mudaria. A alegria de trabalhar não durou mais que dois anos, e terminou naquela tarde, naquele sorriso falso para o chefe.
Na farmácia do bairro o balconista receitou bromazepam de 3 mg, para tomar ½ comprimido antes de ir trabalhar. Antes de começar sua nova função e o medicamento ela decidiu se consultar com você.


12) O quadro de ansiedade da Sra. Assunção parece ser patológico, diferente da ansiedade que acomete a maioria das pessoas? Justifique.
Sim. É comum que as pessoas tenham, por exemplo, certo temor de apresentações em público, mas geralmente conseguem disfarçar bem, contornar a situação e realizar a tarefa, sem grandes comprometimentos da qualidade dessa tarefa. E o mesmo ocorre no âmbito das relações sociais. Mas esse não é o caso em questão. O desempenho da paciente é prejudicado, ela chega a mudar de atitude, e inclusive já chegou a ser despedida do seu emprego. Ou seja, devido ao seu quadro, há um grande comprometimento da sua vida profissional, e provavelmente da sua vida social também. “A evolução do transtorno de ansiedade social vai limitando cada vez mais a vida da pessoa e pode gerar complicações como o abuso e dependência de álcool ou depressão”, como foi o que aconteceu com essa paciente.

13) Você acha que, além da psicoterapia, ela poderá se beneficiar do tratamento farmacológico? Justifique.
Sim. O quadro prejudica muito a qualidade de vida da paciente, e estudos demonstram que a combinação psicoterapia+tratamento farmacológico é mais eficaz que uma das abordagens isoladamente.

14) Segundo os textos, que drogas são comprovadamente eficazes para o tratamento da Sra. Assunção?
Paroxetina (IRS), Fluoxetina, Sertralina, Escitalopram, Fluvoxamina, Venlafaxina (IRSN), Clonazepam, Alprazolam, Bromazepam (BZP, por curtos períodos, ou somente antes da exposição a situações desencadeadoras do quadro).
DÚVIDA: também nesse caso, eu poderia utilizar beta-bloqueador em dose baixa antes das situações desencadeadoras do quadro??

15) A “prescrição” do balconista foi adequada? Quais serão os benefícios e riscos de utilizar o benzodiazepínico no curto e longo prazo?
A prescrição do balconista foi inadequada, uma vez que há pouca evidência por ensaios clínicos que demonstrem sua eficácia. Os benzodiazepínicos são medicamentos úteis, porém de 2ª linha para o tratamento de Ansiedade Social, não só porque os ISRSs são mais bem estudados, como porque os BZPs apresentam potencial de desenvolvimento de tolerância e dependência com o uso prolongado. Os BZPs podem ser utilizados esporadicamente, isto é, uso ocasional, atenuando os sintomas de forma imediata. Mas podem causar sedação excessiva, efeito depressor sobre o Sistema Nervoso Central potencializado pelo consumo de bebidas alcoólicas, prejuízo de funções cognitivas, disfunção psicomotora e sexual, bem como toxicidade comportamental (“ansiedade paradoxal”- agressividade ou irritabilidade).

16) Você sabia que há comprimidos de bromazepam de 3 e 6 mg? E de alprazolam de 0,5, 1 e 2 mg? E de clonazepam de 0,5 e 2 mg? Qual seria a razão?
Sim. Provavelmente há essa variedade de apresentação quanto a posologia devido a possibilidade do desenvolvimento de tolerância com o uso prolongado desses medicamentos, o que ocorre muito comumente.

17) Considere os efeitos adversos dos medicamentos recomendados pelos textos e escolha uma droga (diferente da que o Sr. Pacífico utilizou) para o tratamento da paciente. Faça uma prescrição com o nome genérico, dose e modo de usar.
Uso oral:
Cloridrato de Sertralina                            25 mg                             60cp/mês  
Tomar um comp. pela manhã durante uma semana. Depois de uma semana, tomar 2 comp. pela manhã.

18) Em quanto tempo ela começará a obter os benefícios do medicamento?
Geralmente, os benefícios começam a aparecer depois de algumas semanas de tratamento (cerca de 4 semanas, podendo haver melhora gradual até cerca de 12 semanas).
19) Em quanto tempo já perceberá os efeitos adversos do medicamento? Quais são os efeitos adversos mais prováveis?
Os efeitos adversos podem surgir logo após o primeiro comprimido, ou com poucos dias de tratamento. No caso da Sertralina, que é um ISRS, os efeitos adversos mais comuns são ansiedade ou agitação iniciais, náuseas e/ou diarréia, cefaléia (o que se restringe às primeiras semanas de uso), tremores, boca seca, sudorese, tonturas.

20) O que fazer para evitar que ela abandone o tratamento neste período?
É de extrema importância estabelecer uma boa relação médico-paciente, e explicar que os efeitos adversos tendem a diminuir ou até mesmo desaparecer com a terapia prolongada; e que os efeitos terapêuticos podem demorar até cerca de 4 semanas para se manifestarem. Pode-se solicitar retorno, então, para avaliação em cerca de um mês e/ou 3 meses.

21) Durante quanto tempo ela deverá manter o tratamento?
O tratamento deve ser mantido por 2 anos, para reduzir o risco de recaídas.

22) Imagine que quando você propôs sua prescrição para ela, ela comentou: “Já tomei este medicamento uma vez e passei muito mal. O Sr. poderia me prescrever outro?” Qual seria uma 2ª opção?
Uso oral:
Cloridrato de Venlafaxina __________25mg                     90 cp/mês
Tomar 1 cp. de 8/8 hs.

Fim do caso clínico.


[1] Associação Brasileira de Psiquiatria. Transtornos de Ansiedade: Diagnóstico e Tratamento. Projeto Diretrizes da Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina, 2001.
[2] Ramos RT. Transtornos de Ansiedade. Revista Brasileira de Medicina 66(11):365-74, 2009.
[3] Mochcovitch MD, Crippa JAS, Nardi AE. Transtornos de Ansiedade. Revista Brasileira de Medicina 10(67):390-9, 2010.

Um comentário:

Anelise Impellizzeri disse...

As opçòes são inúmeras e o tratamento, a meu ver, é melhor se não-farmacológico, com abordagem psicológica, comportamental.
Abs
Anelise

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